Tive o prazer de assistir na sexta-feira a defesa da tese de doutorado do Hugo Segundo. Como eu havia lido uma versão preliminar do texto, foi muito proveitoso assistir as críticas, os elogios e os comentários que a comissão avaliadora fazia. O Hugo saiu-se muitíssimo bem, como seria de se esperar.
A tese versou sobre um tema de filosofia do direito: fundamentos do ordenamento jurídico. Pelo que ele me disse, já será publicada em breve com o título “Fundamentos do Direito” pela editora Atlas.
Apesar de ser um tema filosófico, a linguagem por ele utilizada, já conhecida pela clareza e simplicidade, convida o leitor a ir em frente, tentando desvendar com ele os problemas dificílimos que se propôs a enfrentar com ousadia. Li em apenas dois dias, pelo computador, a versão que ele havia me enviado. Não é fácil tratar de um tema que já vem sendo debatido há milhares de anos sem qualquer consenso à vista.
Das críticas apresentadas, concordei com algumas feitas pelo professor Gustavo Just da Costa e Silva. Ele disse uma coisa certa: o trabalho, apesar de ser filosófico, foi escrito por um jurista. Esse aspecto é importante porque a abordagem de um problema filosófico feita por um filósofo profissional é muito diferente da abordagem do mesmo problema feita por um jurista. Não muda apenas o estilo da linguagem, mas até mesmo o método do pensamento: o jurista pensa mais concretamente, enquanto que o filósofo raciocina de forma muito mais abstrata. O texto filosófico é mais “lento”, por assim dizer. O filósofo vai caminhando vagarosamente até chegar a uma solução satisfatória. O jurista dá muitos saltos: parte de algumas premissas que simplesmente pressupõe verdadeiras porque não consegue imaginar que possam ser falsas. Que jurista partiria do princípio que a constituição, os direitos fundamentais, a democracia podem estar errados? Os filósofos não se apegam a esses tipos de dogma.
Em relação às outras críticas apresentadas, o Hugo saiu-se mutíssimo bem. Criticaram, por exemplo, o fato de ele ter citado autores muito diferentes entre si, de épocas diversas e com ideologias diversas. A resposta do Hugo foi muito boa: estou discutindo problemas. Logo, se vários autores diferentes, em épocas diferentes, trataram dos mesmos problemas, não há óbice para citar seus argumentos.
Hugo correu um risco digno de nota: não se apegou a nenhum referencial teórico específico. Aliás, se tem uma coisa que me irrita é a pergunta: qual o seu referencial teórico? Traduzindo: qual é o autor que você costuma seguir? Ou então: você vai pesquisar sobre quem?
O que está por detrás desse tipo de pergunta é a prova de que ninguém quer pensar seriamente sobre os problemas. Prefere-se escolher um “marco teórico” e, a partir daí, tudo fica mais fácil, pois se transfere o ônus da consistência para o referencial adotado. As eventuais falhas argumentativas que possam ser detectadas no seu texto não podem ser atribuídas a você ou ao seu trabalho, mas ao respeitado autor que você optou por seguir. Nada mais covarde.
O problema disso não está propriamente em seguir uma determinada linha de pensamento que você concorda. Isso é natural, já que é impossível não se valer dos conhecimentos já produzidos para poder seguir em frente. O próprio Isaac Newton, cuja genialidade era indiscutível, reconheceu que precisou subir nos ombros dos gigantes para poder desenvolver a sua teoria física que revolucionou a ciência moderna.
“Subir nos ombros dos gigantes” é algo positivo e até mesmo necessário. Porém, devemos subir nos ombros dos gigantes não para catar os seus piolhos, mas para olhar mais longe. Aqui no Brasil, infelizmente, alguns acadêmficos costumam subir nos ombros dos gigantes apenas para ficar fazendo cafuné nas suas cabeças. Felizmente, esse não foi o caso do Hugo.
Está, pois, de parabéns o novo doutor. Só resta aguardar o livro. Por George Marmelstein Lima
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