terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Crimes Contra Liberdade Individual

O Código Penal brasileiro traz em seu Capitulo VI da Parte Especial, a liberdade individual, que vem a ser a faculdade de exercer as próprias vontades, nos limites do direito. É assim a faculdade que tem o homem de exercer as próprias atividades sem violar o direito dos demais, e esta liberdade vem consagrada em vários dispositivos da Constituição Federal (art. 5º, incisos II, IV, V, VI, VIII, IX, X, XI etc.). Dos crimes contra a liberdade pessoal fazem parte: o constrangimento ilegal (art. 146), a ameaça (art. 147), o sequestro, o cárcere privado (art. 148) e redução à condição análoga à de escravo (art. 149). Há outros crimes em que a liberdade pessoal é também atingida, mas o fato é apenas meio para a consecução de fins diversos, como econômicos (roubo, extorsão etc.), libidinosos (estupro, atentado violento ao pudor) etc., em que o atentado à liberdade é absorvido pelo crime fim, são eles conhecidos por crimes subsidiários. Constrangimento ilegal Art. 146. Constranger alguém, mediante violência ou grava ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela manda: Pena detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Aumento de pena 1º As penas aplicam-se cumulativamente e em dobro, quando, para a execução do crime, se reúnem mais de três pessoas, ou há emprego de armas. 2º Além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência. 3º Não compreende na disposição deste artigo:
I-

a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento

do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida;

IIIII-

a coação exercida para impedir o suicídio.

Características do delito Tutela-se a liberdade individual de querer, ou seja, a autodeterminação da vontade e da ação, incluindo-se, assim, a liberdade física e psíquica da vítima. É o dispositivo corolário do art. 5º, II, da Constituição Federal: Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Assegura-se assim ao individuo o direito de fazer tudo o que a lei não proibir, não podendo ser obrigado a fazer senão aquilo que a lei lhe impuser. Sujeito ativo O constrangimento ilegal é crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa. Entretanto, se o agente for funcionário público, praticando crime no exercício de suas funções, ocorrerá outro tipo penal (arts. 322 e 350 do CP e art. 3º da Lei nº 4.898/65). Sujeito passivo É sujeito passivo do delito a pessoa física que possui capacidade de querer. Excluídos estão como sujeitos passivos, os doentes mentais, o ébrio total, as crianças de tenra idade e as pessoas inconscientes. Serão estes, porém, objeto do crime quando o constrangimento se exercer contra seus representantes, forçando-os a permitir que se faça algo com relação aos incapazes. A violência pode ser exercida contra pessoa diversa daquela a que se procura constranger. Momento consumativo Consuma-se o crime de constrangimento ilegal quando o ofendido faz ou deixa de fazer aquilo a que foi constrangido. Deve-se ter presente que não se trata de crime de mera atividade, que se consuma com a simples ação mas crime de lesão que tem uma execução complexa,exigindo duplicidade comportamental: a ação coativa do sujeito ativo e a atividade coagida do sujeito passivo, fazendo ou não aquilo a que foi constrangido. Assim, consuma-se o crime quando o

constrangido, em razão de violência ou grave ameaça sofrida, começa a obedecer ou não obedecer à imposição do sujeito ativo. Enquanto o coagido não ceder a vontade do sujeito ativo, isto é, enquanto não der inicio ao fazer ou não fazer ,a violência ou grave ameaça poderão configurar somente em tentativa. Como crime material, admite a tentativa, que se verifica com o inicio da ação constrangedora, que pode ser fracionada. A exigência de uma execução complexa, com a ação do sujeito ativo, de um lado, e atividade do coagido, de outro, facilita a identificação do conatus. Podem ocorrer também às hipóteses de desistência voluntaria e arrependimento eficaz, respondendo o agente, é claro, pelos atos já executados, nos termos do art.15. Formas qualificadas Em dois casos qualificam-se o delito e as penas de detenção e multa, alternativas no crime simples, são ambas cumuladas e duplicadas. A primeira hipótese ocorre quando para a prática de um crime, se reúnem mais de três pessoas (art.146, 1º, 1ª parte). Exige-se, no caso, que cada participe do ato executivo do crime e, eventualmente, poderá haver concurso material com o delito de quadrilha ou bando (art. 288). Na segunda hipótese de crime qualificado é aquela em que há emprego de arma (art. 146, 1º, 2ª parte). É necessário que a arma (própria ou imprópria) seja utilizada pelo agente, para lesionar ou ameaçar, não se configurando o agravamento pelo simples porte dela. Entende-se inexistir a qualificadora quando se trata de arma simulada. Natureza subsidiária Não é recomendável afirmar, simplesmente , que é um crime tipicamente subsidiário; ao contrário, o 2º determina que, além das penas cominadas, aplicam-se as correspondentes à violência ; logo, o constrangimento ilegal não é sempre absorvido pela violência. Na verdade, somente haverá a subsidiariedade naqueles crimes em que o constrangimento constituir meio de realização ou for seu elemento integrante, tais como roubo, extorsão, estupro, atentado violento ao pudor

etc., ficando o constrangimento ilegal absorvido. Assim, pode-se admitir que se trate de um crime, eventualmente subsidiário. Por isso, parece mais adequado adotar a terminologia preferida por Manzini, segundo o qual se trata de um meio repressivo suplementar , que subsiste somente quando não é meio ou elemento constitutivo de outro crime. Quando determinado comportamento, mesmo tipificado, como ocorre com constrangimento ilegal , constitui meio executivo ou elemento constitutivo de outro crime, integra a definição típica deste, configurando fato único, que é objeto de um único e mesmo dolo, como pó exemplo: roubar, extorquir, estuprar, atentar contra o pudor etc. Contudo, o fim pretendido nesses crimes referidos, não é somente o constrangimento de fazer o que a lei não obriga ou abster o que a lei não proíbe, mas vai além objetiva atingir outros bens jurídicos sendo constrangimento, nesses casos, o meio normal e natural para a realização da conduta pretendida; este é parte de um todo, integrando o iter criminis já em sua fase executória. O fim proposto, efetivamente, é maior, mais abrangente, mais danoso, do qual o constrangimento apenas qualifica a natureza do modus operandi, como ocorre nos antes referidos crimes de roubo, extorsão, estupro, atentado violento ao pudor etc., pois nesses crimes o constrangimento constitui elementar típica, ficando subsumido, como figura subsidiária. Exemplo: Incorre no delito de constrangimento ilegal marido que constrange a mulher, sob grave ameaça com arma de fogo, a acompanhá-lo até a residência dos pais dela, sendo irrelevante que intento final de tal coação (reconciliação do casal) não tenha sido atingido.

Ameaça Art. 147. Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave: Pena- detenção, de 1(um) a 6 (seis) meses, ou multa.

Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.

Características do delito O crime em tela consubstancia-se pelo fato do agente intimidar outra pessoa por meio de gestos, escritos ou palavras. Todavia, há de se observar que a ameaça deve prever mal injusto e grave, no sentido de jurar, prometer algo nocivo. A ameaça, que é meio de execução do crime de constrangimento ilegal e elementar de outros, pode constituir, em si mesma, crime autônomo. Na conceituação do crime de ameaça (art. 147 do CP) não é preciso que o mal prometido constitua crime, bastando que seja injusto e grave. Não é somente incriminada a ameaça verbal ou por escrito, mas também a ameaça real ou a simbólica. Nada impede também a ameaça à distância (por telefone, e-mail, e, etc.) ou transmitida à vítima por terceiro. Relevante é que a ameaça deva ser idônea e capaz de abalar a tranqüilidade psíquica da vítima. Assim como afirma Aníbal Bruno: é um constrangimento que se contenta só com o constranger. O seu fim é realmente perturbar a paz do sujeito passivo e com este sentimento pessoal de insegurança restringe-se e muitas vezes se anula a sua liberdade de querer. Para sua caracterização é essencial que exista o dolo consciente de amedrontar o outro. O bem jurídico tutelado, assim como o crime de constrangimento ilegal, é a liberdade pessoal e individual de autodeterminação, isto é, a liberdade psíquica do indivíduo, que será abalada pelo temor infundido pela ameaça. Sujeito ativo

Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, não requerendo nenhuma particularidade, tratando-se assim de crime comum. Quando se tratar de funcionário público, no exercício de suas funções, a ameaça poderá configurar o crime de abuso de autoridade (art.3º da Lei n. 4.898/65).

Sujeito passivo O sujeito passivo pode ser qualquer pessoa física, desde que seja capaz de sentir a idoneidade da ameaça e motivar-se com ela, atemorizando-se; em outros termos, é necessária a capacidade de conhecer e de autodeterminar de acordo com esse conhecimento. Portanto essa exigência afasta os enfermos mentais, as crianças de tenra idade, os loucos de todo o gênero etc., desde que não tenham capacidade de compreensão e entendimento, que não se confunde com capacidade jurídica. Momento Consumativo A consumação da ameaça ocorre no momento em que o teor da ameaça chega ao conhecimento do ameaçado. Se este a desconhece, não se pode dizer ameaçado. É desnecessário que a ameaça crie na vítima o temor da sua concretização ou que, de qualquer forma perturbe a sua tranqüilidade, tratando-se, pois, de crime formal. É suficiente que tenha idoneidade para atemorizar, para amedrontar, isto é, que tenha potencial intimidatório. A tentativa é de difícil configuração, embora, na forma escrita, haja quem sustente sua viabilidade. Como se trata de crime de ação pública condicionada, isto é, a que somente se procede mediante representação, destaca Damásio de Jesus, com muita precisão, que se o sujeito exerce o direito de representação é porque tomou conhecimento do mal pronunciado. Se isso ocorreu, o crime é consumado e não tentado .

Natureza subsidiária Trata-se efetivamente de um crime tipicamente subsidiário: se a ameaça deixa de ser um fim em si mesmo, já não se configura um crime autônomo, passando a constituir elemento, essencial ou acidental, de outro crime; a ameaça, nesses casos, é absorvida por esse outro crime. Portanto, quando a ameaça é meio executório de outro crime, como, por exemplo, do constrangimento ilegal, roubo, extorsão fica este delito absorvido por estes mais gravosos. Não é punida, pois como crime autônomo.

Pena e ação penal No crime de ameaça não constitui aumento de pena nem forma qualificada. A pena cominada é alternativamente, a de detenção de um a seis meses, ou multa. A regra é que esse crime se resolva na audiência preliminar do Juizado Especial Criminal (art. 74 da Lei n. 9.099/95). A ação penal é pública condicionada à representação do ofendido. A natureza da ação penal é pública, mas a iniciativa da autoridade depende de provocação da vítima. Exemplo: Só ameaça séria e idônea configura o crime do art. 147, ainda que o agente não tenha intenção de praticar o mal prometido. O agente que, munido de uma faca, faz ameaça à esposa, com o intuito que esta se reconcilie, praticando ameaça que cause medo e pavor à vítima. Se este o fizer com intenção de praticar medo na vítima incorrerá no crime do art.147.

Seqüestro e Cárcere Privado Art. 148. Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado: Pena- reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. 1º A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos: I se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 anos; II- se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital; III- se a privação da liberdade dura mais de 15 (quinze) dias;

IV- se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos; V- se o crime é praticado com fins libidinosos. 2º Se resulta a vitima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral: Pena- reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos. Características do Delito O seqüestro e o cárcere privado previstos no art. 148 CP apresenta como núcleo do tipo o significado de tolher, impedir, tirar o gozo da liberdade, desapossar. É uma restrição ao direito de ir e vir no aspecto físico e, não no intelectual.

O seqüestro não tem o significado de tolhimento de liberdade de expressão. Exige-se a situação de permanência, tanto assim que é doutrinariamente classificado como delito permanente (ou seja, aquele que se consome e se prolonga no tempo). Se ocorre a conduta instantânea de impedir que alguém faça alguma coisa que a lei lhe autoriza concretizar, segurando-a por alguns minutos, configura o delito de constrangimento ilegal. O seqüestro é a conduta gênero da qual é espécie o cárcere privado. Manter alguém em cárcere privado é o mesmo que encerrá-la em uma prisão ou cela, ou recinto fechado, isolando-a, sem a possibilidade de livre locomoção. O bem jurídico protegido, neste tipo penal, é a liberdade individual, especialmente a liberdade de locomoção, isto é, a liberdade de movimento, do direito de ir, vir e ficar: liberdade de escolher o local em que deseja permanecer. Não deixa de ser em sentido amplo, uma espécie de constrangimento ilegal, apenas diferenciado pela especialidade. Sujeito ativo O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, já que se trata de crime comum, ou seja, não requer nenhuma qualidade ou condição particular, porém, se apresentar a qualidade de funcionário público, e praticar o ato no exercício de suas funções, poderá configurar o crime de abuso de autoridade (Lei n. 4.898/65).

Sujeito passivo Sujeito passivo pode ser qualquer pessoa, independentemente da capacidade de conhecer e de autodeterminar-se de acordo com esse conhecimento, incluindo-se, portanto, os enfermos mentais, as crianças de tenra idade, os loucos de todo o gênero etc., ao contrário do que ocorre com os crimes anteriores. Embora essas pessoas possam não ter capacidade de querer e de exercer o seu direito de liberdade, o seqüestro ou cárcere privado elimina-lhes a possibilidade de serem auxiliados. Momento Consumativo

Consuma-se com a efetiva restrição ou privação da liberdade de locomoção, por tempo juridicamente relevante. Afirma-se, que, se a privação da liberdade for rápida, instantânea ou momentânea, não configurará o crime, admitindo-se, no máximo, sua figura tentada ou, quem sabe, constrangimento ilegal. Essa fase do inter criminis alonga-se no tempo, perdurando enquanto a vítima permanecer privada de sua liberdade, não se encerrará a consumação, podendo, inclusive, o sujeito ativo ser preso em flagrante. Como crime material, admite a tentativa, que se verifica com a prática de atos de execução, sem chegar à restrição da liberdade da vítima, como, por exemplo, quando o sujeito ativo está encerrando a vítima em um depósito é surpreendido e impedido de consumar seu intento. Tratando-se, porém, de forma omissiva, a tentativa é de difícil ocorrência. Formas Qualificadas Prevê o 1º cinco circunstâncias que qualificam o crime de seqüestro ou cárcere privado. A primeira delas ocorre quando a vitima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 (sessenta) anos (inciso I). Além da inclusão da pessoa com mais de 60 anos pelo Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 1 (º-10-2003), o inciso, com a nova redação dada pela Lei nº 11.106, de 28-3-2005, passou a abranger também o companheiro e não apenas o cônjuge. Justifica-se, assim, a exasperação da pena pelos laços de sangue ou efetivos desrespeitados pelo agente ou pela condição da vitima de pessoa idosa que, por presunção, reduz a capacidade para suportar a privação.

A segunda causa qualificadora ocorre quando o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital (inciso II). Esse fato denuncia a possibilidade de maior dano e o envolvimento de perversas intenções. Como afirma Costa e Silva, não se contenta o agente em privar a vitima de liberdade; mas

acrescenta a esse mal a suspeita de não se achar ela em estado de integridade física ou mental . O médico ou o diretor do hospital ou casa de saúde que auxilia ou consente a internação, com conhecimento de causa, concorre para o crime como co-autor. Qualifica-se, ainda, delito se a privação da liberdade dura mais de quinze dias (inciso III). A maior reprimenda é exigida pelo maior dano causado à liberdade do sujeito passivo. No inciso IV, inserido pela Lei nº 11.106, de 28-3-2005, é descrita outra circunstância qualificadora: se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos . Protegem-se com maior rigor os menores, crianças e adolescentes, que ainda têm a personalidade em formação e mais reduzida capacidade de compreensão e de resistência para suportar as privações decorrentes do crime. O mesmo diploma legal acrescentou ao 1º do art. 148 o inciso V, prevendo como qualificado o seqüestro se o crime é praticado com fins libidinosos . Antes da revogação dos arts. 219 a 222 pela Lei nº 11.106, o seqüestro com fim libidinoso constituía o crime de rapto, do qual, porém, somente podia ser vítima mulher honesta (art.219), prevendo, ainda, a lei anterior que o consentimento daquela que tinha mais de 14 e menos de 21 anos deslocava a tipicidade para a do crime de rapto consensual (art.220). Configurando, agora, a conduta o delito de seqüestro qualificado, o sujeito passivo pode ser tanto o homem como a mulher, independentemente da honestidade desta. Se o seqüestro com o fim libidinoso é cometido contra menor de 18 anos de idade há incidência de duas qualificadoras (incisos IV e V). Não é necessária para a caracterização de qualificadora a pratica de ato libidinoso, bastando que seja esta a intenção do agente. Se durante o seqüestro pratica ele um crime contra os costumes (estupro, atentado violento o pudor etc.,), responderá por ambos os delitos em concurso.

A pena é ainda severa (reclusão de dois a oito anos) se resulta à vitima, em razão de maus-tratos ou da natureza da detenção, grave sofrimento físico ou moral (art.148, 2º). Ensina Costa e Silva: A detenção pode efetuar-se em lugar lôbrego e insalubre, com ferro ou correntes, com privação de alimentos, enfim, com revoltante crueldade. O sofrimento físico ou moral da vitima agravará a qualidade política do crime, revelando maior perversidade do autor. Sofrimento físico são lesões, doenças, perturbações à integridade corporal; sofrimentos morais são as perturbações psíquicas, a vergonha, o terror etc. Como exemplo destes últimos pode ser citado o exemplo de Noronha, que figura a hipótese do encerramento de mulher honesta, deixada em trajes íntimos ou desvestida, exposta aos olhos dos carcereiros. É indispensável, entretanto, que o maior sofrimento decorra de maustratos (violência, falta de alimentação, asseio, medicamentos etc.) ou da natureza da detenção (privação da liberdade em local insalubre, em cemitério etc.). Já se decidiu, porém, que a lesão corporal realizada no ato do seqüestro não caracteriza maus-tratos ou sofrimento (RT 553/425, 517/279). É ela apenas a violência como meio para a prática do seqüestro. Natureza subsidiária Os delitos contra a liberdade pessoal têm um caráter subsidiário em relação aos outros tipos penais. Assim é que se o agente tiver a finalidade de mediante o seqüestro, receber vantagem, incidirá o delito do artigo 159 (extorsão mediante seqüestro). Observe que no caso da extorsão mediante seqüestro é elementar do tipo a finalidade de obter qualquer vantagem, para si ou para outrem, de modo que se restar comprovado que o agente não tinha esse animus, o crime será de constrangimento ilegal, mediante seqüestro. Importa fazer uma distinção. Foi dito que, no tipo penal em tela, o agente tem o dolo de privar a liberdade da vítima, sem disso pretender auferir qualquer vantagem patrimonial. Ora, há uma diferença ampla no que se refere ao que corriqueiramente se chama de "seqüestro-relâmpago", o qual não se constitui como tipo penal e consiste na privação ou restrição da liberdade da vítima com o escopo de que o agente aufira vantagem patrimonial. O que se chama "seqüestrorelâmpago", no Estatuto Penal pode-se configurar como um dos três delitos a seguir:

roubo com restrição de liberdade (artigo 157, 2º, V), extorsão (artigo 158) ou extorsão mediante seqüestro (artigo 159). Exemplo: A morte da garota Eloá, de 15 anos, complicou ainda mais a situação criminal de Lindemberg Fernandes Alves, de 22 anos, o ex-namorado da jovem que a manteve em cárcere privado por quase 101 horas. Segundo o delegado Luiz Carlos dos Santos, seccional de Santo André, Lindemberg seria autuado em flagrante por três tentativas de homicídio, mas, agora, responderá por homicídio doloso e duas tentativas de homicídio, além de cárcere privado e periclitação de vida. Neste caso o crime de cárcere privado se tornou subsidiário do crime principal que foi o homicídio da vitima.

Redução a Condição Análoga de Escravo Previsto no artigo 149 Código Penal, onde há sua definição, com a seguinte redação: Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer subentendo - a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer outro meio, sua locomoção em razão de divida contraída com o empregador ou preposto Pena Reclusão: 02 (dois) a 08 (oito) anos e multa, além da pena corresponder à violência
1o. Nas mesmas penas incorre quem: I cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. " 2o. A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:

I contra criança ou adolescente; II

por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem .

Características do Delito A redução a condição análoga à de escravo, está previsto no código Penal elencado em seu artigo 149. O significado desse delito vem baseado a liberdade individual do sujeito. Embora o agente não prenda a vítima diretamente, ele cria condições adversas para que ela não manifeste a sua vontade. O consentimento do ofendido é IRRELEVANTE, uma vez que a situação de liberdade do homem constitui interesse preponderante do Estado. O fato só é punível a título de DOLO. Trata-se de crime PERMANENTE. Admite-se a TENTATIVA. NÃO CONFUNDIR este tipo com o art. 203 - relativo a frustração de direitos trabalhistas - Isso não é exatamente o mesmo que reduzir a condições análogas a de escravo. Art. 203 - Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho: Pena - detenção de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente à violência. (Redação dada pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998) 1º Na mesma pena incorre quem: (Incluído pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998) I - obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida; (Incluído pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998) II - impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998) 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998) Já o 2º, II não se relaciona com o crime de racismo previsto na lei 7716/89. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. Trata-se de um crime em que os antigos chamavam plagium.

Etimologiamente, plágio é desvio de escravo e plagiário o que toma para si escravo alheio. Por extensão, porém, as palavras tomaram o sentido mais conhecido de apropriação e de apropriador de trabalho literário ou científico literário alheio.

Sujeito ativo Sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que pratica a conduta por uma das formas previstas no dispositivo e não apenas o empregador, não se cuidando de crime próprio. A relação que se estabelece entre os sujeitos do crime é, como diz o texto legal, análoga à existência entre o senhor e o escravo, pois a liberdade deste paira sob o domínio do senhor e dono. Sujeito Passivo Todo ser humano, sem distinção de raça, cor, sexo ou idade, pode ser vítima do delito, não importando que seja pessoa civilizada ou não. Se a vítima é criança ou adolescente, incide a causa de aumento de pena prevista no 2º. Momento Consumativo: Com a efetiva redução da vitima a condição à de escravo com a prática de uma das condutas incriminadas. Não Basta, por exemplo, uma eventual jornada exaustiva ou uma esporádica condição degradante de trabalho. Segundo doutrinadores (Cezar Roberto Bitencourt), a consumação se dá com a redução do ofendido a condição análoga à de escravo por tempo relevante, isto é, quando a vítima se torna totalmente submissa ao poder de outrem. Trata- se de crime comum material, comissivo e permanente. Formas Qualificadoras: Neste 2º, aumenta-se a pena da metade, quando o crime for praticado:
I.

Contra criança ou adolescente. O estatuto da Criança e do Adolescente, em seu que entre 12 e 18 anos incompletos. No entender de José Henrique Pierangeli, o código civil admite a possibilidade de emancipação aos dezesseis anos objetivando a harmonização dos dois diplomas legislativos, é de rigor estabelecer que, para a expressão legal, adolescente é aquele que se encontra entre 12 e 16 anos. Todavia, discorrendo sobre a imputabilidade

penal para menores de 18 anos, o critério do discernimento foi adotado exclusivamente para fixação da capacidade civil de
II.

exercício de direito no âmbito das relações da vida civil ,

enquanto o direito penal. não adotou esse mesmo critério de discernimento, mas sim, o critério normativo, inspirado por princípios constitucionais, políticos, portanto . A inclusão deste inciso nos pareceu desnecessária, por que as razões levam o sujeito a praticar o delito em comento são de natureza econômica e não outras. Todavia, caso se comprove que o crime foi praticado por um dos motivos elencados, ou também por eles, a qualificadora restará configurada.

Exemplo: Infelizmente, o crime de redução a condição análoga à de escravo continua a ser praticado em nosso em nosso país, inclusive nos Estados mais prósperos da Federação. Em 2006, ano em que o Brasil tornou-se o maior produtor mundial de açúcar, São Paulo, vergonhosamente, registrou quinze casos de cortadores de cana que, recebendo pagamento em razão da tonelagem cortada, e não em forma de salário fixo (o que diminuiria a exaustão desse trabalho que, por sua natureza já é esgotante), acabaram morrendo durante o trabalho no campo. É preciso, todavia, não generalizar, não havendo que se falar no crime deste artigo 149 na hipótese dos funcionários estarem todos com suas carteiras de trabalho registradas, recebendo salários mediante sistema bancário com ampla liberdade de ir e vir, assistência médica e odontológica, com lazer, dormitórios devidamente estruturados, trabalho com equipamentos de segurança, além de alimentação digna, água e área para descanso com devida proteção do sol no campo, banheiros móveis e etc. Os grupos de repressão à escravidão contemporânea têm identificado, nos últimos anos, diversos elementos indiciários da redução de pessoas a condição análoga à de escravos, notadamente nas zonas rurais. Merece particular atenção denúncia-crime conjunta do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho, oferecida à Justiça Federal de Rondônia (3ª Vara de Porto Velho),(18) em

que

foram

discriminados

diversos

elementos

que

tendem

a

caracterizar,

hodiernamente, a escravidão no campo. Ei-los: 1. Falta de pagamento de salários; 2. Alojamento em condições subumanas (e.g., barracos de lona); 3. Inexistência de acomodações indevassáveis para homens, mulheres e crianças (convivência promíscua); 4. Inexistência de instalações sanitárias adequadas, com precárias condições de saúde higiene (e.g. falta de material de primeiros socorros ou de fossas sépticas); 5. Falta de água potável e alimentação parca; 6. Aliciamento de trabalhadores de uma para outra localidade do território nacional (que, isoladamente, configura o crime do art. 207, caput, do CP, com pena cominada de um a três anos e multa); 7. Aliciamento de trabalhadores de fora para dentro ou de dentro para fora do país (e.g., bolivianos e outros hispano-americanos mantidos em condições análogas à de escravo em fábricas têxteis clandestinas nos grandes centros urbanos); 8. Truck-system (os populares barracões , que têm representado o renascimento da servidão por dívidas); 9. Inexistência de refeitório adequado para os trabalhadores e/ou de cozinha adequada para o preparo de alimentos; 10. Ausência de equipamentos de proteção individual e/ou coletiva;

11. Meio ambiente de trabalho nocivo (selva, chão batido, animais peçonhentos, (Umidade etc.); 12. Coação física ou moral (vis relativa ou absoluta); 13. Cerceamento da liberdade ambulatória (o direito de ir e vir é limitado pelas dis-(18) Autos n. 2003.41.00.003385-5 (Justiça Pública vs. José Carlos de Souza Barbeiro [fazendeiro] e Lídio dos Santos Braga [agricultor]). 14. Falta de assistência médica; 15. Vigilância armada e/ou presença de armas na fazenda; 16. Ausência de registro em CTPS. Essas condições traduzem, com efeito, a situação de um trabalhador em regime de semi-escravidão, pois tornam a sua condição análoga à de um escravo, naquilo que era a idéia fundamental do instituto jurídico da escravidão (que ainda tinha assento, entre nós, no recém-revogado Código Comercial de 1850): a pessoa como res, despossuída, privada de direitos mínimos (inclusos os fundamentais) e moral ou fisicamente acuada. Tomando aquele documento (a denúncia) como contribuição doutrinária, vínhamos considerando, para fins de exercício da jurisdição trabalhista, que a presença desses elementos indiciários, na totalidade ou em maioria, seria bastante para a caracterização da escravidão contemporânea (e, por conseguinte, do delito de plágio in tese, dando ensejo à notitia criminis compulsória do art. 40 do Código de Processo Penal, (19) além de todas as repercussões trabalhistas típicas).

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