O preço da condescendência do
STF com a farra grotesca em torno
do impeachment. Por Carlos
Fernandes
Não existe almoço grátis.
O Nobel de economia, Milton Friedman, utilizou essa expressão
para mostrar que são os impostos cobrados da população que
financiam os gastos e investimentos públicos de um governo.
A política brasileira que possui a impressionante habilidade de
inverter e subverter toda e qualquer lógica dos mais sólidos
fundamentos econômicos, jurídicos e sociais nos mostra que por
aqui esse termo tem uma aplicação bem mais abrangente e
bem menos republicano, digamos assim.
Vejamos. Do ponto de vista jurídico, não há qualquer argumento
plausível que explique o fato do STF ainda não haver, no mínimo,
afastado Eduardo Cunha de suas funções enquanto presidente
da Câmara dos Deputados.
O estoque de manobras, abusos, afrontas, desrespeitos e intimidações
que EC vem promovendo a cada novo dia parece não ter limites.
Mesmo assim, a Suprema Corte do país continua na mais
inquietante inépcia diante todo um Parlamento afundado em
denúncias enquanto conduz mais um golpe na democracia brasileira.
Mas lembremos que não existe almoço grátis. A condescendência
do STF com a farra grotesca em torno do impeachment tem o seu
preço. Entre os gritos de “sim” justificados por “Deus”, pela “esposa
” e pelos “filhos”, formou-se também a maioria necessária na
Câmara para aprovar o reajuste salarial do judiciário.
Trata-se de uma das famosas pautas-bomba lançadas pelo nosso
bom e velho Cunha para desestabilizar ainda mais as contas públicas.
A medida prevê um aumento de 53% a 78% nos vencimentos
dos servidores do judiciário e magistrados. Ministros do STF
incluídos, naturalmente.
Quanto à responsabilidade fiscal tão defendida oportunamente
pelos arautos da ética e da moralidade, nesse caso não vem ao
caso. Segundo as previsões do Ministério do Planejamento, o acordo
dos cavalheiros, se de fato aprovada, custará aos cofres públicos
R$ 5,3 bilhões ainda em 2016 e chegará a R$ 36,2 bilhões até 2019.
Pois é! Poderes independentes e soberanos auxiliados por
instituições isentas, técnicas e imparciais são para nações que não
admitem que uma quadrilha de ladrões hipócritas subjuguem a
Carta Magna e a vontade expressa das urnas. Parece não ser
o caso do Brasil.
O pior, porque sempre pode ser pior, é que a conta para a
deposição de uma presidente democrática e legitimamente eleita
não está sendo cobrada apenas pelo poder judiciário. A digníssima
bancada BBB -boi, bala e bíblia – também já apresentam as
suas faturas.
Por terem votado em peso a favor do impeachment, a romaria em
encontro à Temer já começou. O pastor Silas Malafaia e afins
estiveram com o vice-presidente no palácio do Jaburu para orar
e abençoar o “eleito” por 1% dos votos. Não sem cobrar o seu
dízimo como de costume.
Exigiram a aprovação do Estatuto da Família, o fim do Estatuto do
desarmamento com o livre comércio, posse e utilização de armas
e como não poderia deixar de faltar, mudanças nas regras de
demarcações de terras indígenas. Retrocessos e nada mais.
Já a cúpula do PSDB e DEM também não deixou barato. Para um
apoio irrestrito ao governo Temer, exigem que a pauta neoliberal
que fez o país se ajoelhar três vezes ao FMI seja seguida à risca.
Até o ex-presidente Collor já entregou um “Plano de Reconstrução”
ao principal beneficiário do golpe. É realmente um filme de horror.
O preço que todos nós teremos que pagar se Michel Temer assumir
realmente a presidência da república será assombroso. Soma-se
aos retrocessos econômicos e sociais, o desmantelamento das
operações de combate à corrupção. Afinal de contas, estamos
falando do PMDB.
Retirar Dilma do lugar que a democracia lhe reservou sob o
estupro da Constituição Federal custará um valor que ninguém
deveria estar disposto a pagar. Porque, definitivamente, não
existe almoço grátis.
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