sábado, 31 de dezembro de 2011

Dom Genival Saraiva

“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo 
ainda há de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de
 precipitar a tua audácia sem freio? Nem a guarda do Palatino, nem a 
ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência 
de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para
 a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores,
 nada disto conseguiu perturbar-te? Não sentes que os teus planos
 estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já 
dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas
 tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente,
 em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações 
foram as tuas? Ó tempos, ó costumes!” Este texto, extraído das 
Catilinárias de Cícero, fazia parte do estudo da língua latina, 
em Seminários e Liceus, “nos anos 30, 40 e 50”, anos do “ ‘velho’ 
e ‘bom ‘ ensino secundário”, nos cursos ginasial e colegial 
(clássico e científico). Cícero, inigualável tribuno romano, moveu
 Catilina a admitir seus erros: “É tempo, acredita-me, de mudares
 essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás
 apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós
 mais claros que a luz do dia.” Proferiu suas “invectivas” contra Catilina,
 também Senador, diante dos absusos e conspirações que praticava
 em Roma. “Se Catilina permanecia no Senado, não era apenas a 
vontade própria que o sustentava, mas sobretudo a cumplicidade 
dos que teriam a perder, com a renúncia dele, proveitos políticos.
” Daí a exclamação de Cícero: ‘Em que país do mundo estamos nós,
 afinal? Que governo é o nosso?’ ” “Oh tempora, oh mores” 
(Ó tempos, ó costumes!)
A indignação verbalizada do tribuno romano, contra personagens
 e costumes de seu tempo, ecoou, ao longo da história. Com efeito,
 sempre houve pessoas e instituições que se tornaram paladinas
 da cidadania e da justiça, diante de condutas de indivíduos e de 
costumes da sociedade, incompatíveis com a dignidade humana e o
 direito das pessoas. Também hoje identificam-se personagens e 
registram-se fatos na sociedade que continuam abusando
 “da nossa paciência”, dado que seus costumes ferem o direito
 dos cidadãos. Felizmente, Cícero continua tendo seguidores:
 há políticos sérios, gestores honestos, cidadãos conscientes; 
há instituições públicas de defesa da ordem jurídica e da cidadania,
 bem como entidades privadas e associações civis que têm seu olhar
 vigilante em torno da prevalência da ética e da verdade. A imprensa
 livre faz a leitura e é a voz da sociedade, ao registrar fatos 
que enaltecem ou denigrem a vida do povo. Graças aos recursos 
da telecomunicação e à versatilidade da internet, a tribuna de 
Cícero no Senado Romano transformou-se numa tribuna
 “urbi er orbi” (para a cidade e para o mundo). 
Não obstante essa presença e ação educativa, avoluma-se, 
no Brasil, o registro de casos de corrupção, tendo como personagens
 empresários e autoridades da União, Estados e Municípios. 
Na ânsia de ganhos financeiros desmesurados, vêm à tona 
outros casos de corrupção. No âmbito do poder público, com mais
 um escândalo de desvio de recursos públicos, com fins escusos, 
desta vez, no Ministério do Esporte, e da iniciativa privada, com
 a importação e venda de lixo hospitalar, proveniente dos 
Estados Unidos, no Nordeste e em outras Regiões. Como Cícero, 
a sociedade deve gritar: “Ó tempos, ó costumes!”

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