PESQUISA
COMPROVA QUE
BRASIL É O
PAÍS DO
LATIFÚNDIO
Quase metade da área rural brasileira pertence a
1% das propriedades do país, de acordo com o
estudo inédito Terrenos da desigualdade: terra,
agricultura e desigualdades no Brasil rural
divulgado hoje (1º) pela organização não
governamental (ONG) britânica Oxfam; os
estabelecimentos rurais a partir de mil hectares
(0,91%) concentram 45% de toda a área de
produção agrícola, de gado e plantação florestal
Flávia Villela - Repórter da Agência Brasil
Quase metade da área rural brasileira pertence a 1% das
Quase metade da área rural brasileira pertence a 1% das
propriedades do país, de acordo com o estudo inédito
Terrenos da desigualdade: terra, agricultura e
desigualdades no Brasil rural divulgado hoje (1º) pela
organização não governamental (ONG) britânica Oxfam.
Os estabelecimentos rurais a partir de mil hectares
(0,91%) concentram 45% de toda a área de produção
agrícola, de gado e plantação florestal.
Por outro lado, estabelecimentos com menos de 10
hectares representam cerca de 47% do total das
propriedades do país, mas ocupam menos de 2,3% da
área rural total. Esses pequenos produtores produzem
mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa do
brasileiro, já que as grandes monoculturas exportam
a maior parte da produção
O estudo mostra a cidade de Correntina, na Bahia,
como exemplo emblemático dessa realidade, onde
os latifúndios ocupam 75,35% da área total dos
estabelecimentos agropecuários. Nessa cidade, a
pobreza atinge 45% da população rural e 31,8% da
população geral. Os municípios com maior concentração
de terra apresentam os menores índices de
Desenvolvimento Humano e aqueles com a menor
concentração tinham os melhores indicadores sociais.
A diretora executiva da Oxfam Brasil, Katia Maia,
explicou que a concentração de terra gera desigualdade
em todos os setores vinculados à produção da terra.
“Quanto maior a concentração de terra, maior a
concentração de investimento, de maquinário, que
vai se expandindo para diferentes setores. A
modernização da agricultura não demonstrou melhora
na condição de vida da população”, comentou Katia.
“Números preliminares mostram que os municípios
com maior concentração têm nível maior de pobreza”.
As grandes propriedades rurais com mais de mil
hectares concentram 43% do crédito rural, enquanto
para 80% dos menores estabelecimentos esse
percentual varia entre 13% e 23%.
A reforma agrária é fundamental para reverter o quadro,
mas não basta, argumentou a diretora da ONG.
“O governo pode assumir medidas e políticas no
mundo rural para incentivar maior distribuição,
especialmente na área de investimentos, apoio
técnico e programas, como o Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar e o
Programa Nacional de Alimentação Escolar”, acrescentou.
A concentração de terra também contribui para a
incidência de trabalho escravo, alerta o estudo. De
2003 a 2013, 82% das autuações do Ministério do
Trabalho e Emprego por trabalho análogo ao de
escravo ocorreram no oeste da Bahia, com grande
concentração de terra. Somente em Correntina,
249 trabalhadores foram encontrados nessas condições.
O estudo agrupou os municípios de acordo com a
relevância agropecuária: 1% com maior concentração
de terras, os 19% seguintes e os 80% restantes,
com base no último Censo Agropecuário do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de
2006, e o IBGE Cidades, de 2010.
Dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra) indicam que 729 pessoas físicas e
jurídicas se declaram proprietárias de imóveis rurais
com dívidas à União de mais de R$ 50 milhões cada,
aproximadamente R$ 200 bilhões. Esse grupo,
segundo a pesquisa, tem propriedades de área
suficiente para assentar quase 215 mil famílias, quase
duas vezes o número de famílias que estão acampadas
hoje no Brasil esperando por reforma agrária.
América Latina
A mesma realidade ocorre na América Latina, em que
1% concentra 51,19% de toda a superfície agrícola
da região. O dado está no relatório Terra, Poder e
Desigualdade na América Latina, também divulgado
hoje, que analisa o cenário de concentração das
propriedades rurais em 15 países da região com base
nos censos agropecuários locais.
O Brasil ocupa o quinto lugar no ranking da região
do coeficiente de Gini - que mede a desigualdade na
distribuição de terra, em que 0 corresponde à
completa igualdade e 1 corresponde à completa
desigualdade. A nota brasileira é 0,87. O Paraguai
aparece com o pior índice de Gini (0,93), seguido do
Chile (0,91) e da Venezuela e Colômbia (0,88),
onde 0,4% das propriedades concentram mais de
67% da terra produtiva.
Conflitos no campo
A modernização da agricultura e os assentamentos
e demarcações de terras indígenas não foram capazes
de aplacar os conflitos, que já mataram 2.262
pessoas entre 1964 e 2010, de acordo com o estudo.
A violência no campo pela disputa da terra ocasionou
50 mortes no ano passado e 1.217 conflitos, segundo
dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O Brasil está no topo da lista dos países onde mais
ativistas ambientais e da terra foram mortos em 2015,
segundo outra pesquisa divulgada em junho deste
ano pela ONG Witness.
Os estados mais violentos são Rondônia e o Pará. No
período, foram registrados momentos de pico, em
especial na década de 80, quando aumentaram as
mobilizações sociais e as lutas por terra, década
que também marcou a fundação do Movimentos dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Um novo
pico foi registrado durante o primeiro governo Lula,
de 2003 a 2006. Apenas em 2003 ocorreram 496
ocupações – em 2010 foram 180.
Incra
De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (Incra), mais de 1,3 milhão de famílias
já foram assentadas desde o início do Programa
Nacional de Reforma Agrária (PNRA). O programa
foi criado em 1996. Ao todo, 977 mil famílias vivem
atualmente em assentamentos e áreas reformadas.
As titulações estão sendo efetivadas, informou o
instituto, por meio de trabalhos de revisão ocupacional
em campo, “o que está sendo feito com maior
expressão neste último bimestre do ano, a partir do
desbloqueio de recursos destinados ao órgão”, diz
a nota. “Todas as 30 superintendências estão
mobilizadas neste sentido, já que foi estabelecida
como meta a emissão de cerca de 70 mil títulos
de propriedade até o fim do próximo ano”.
Ainda segundo o Incra, as metas para os próximos
anos dependem da aprovação do orçamento a ser
destinado à autarquia no início de 2017. O instituto
ressaltou que o contingenciamento de gastos deste
ano reduziu em cerca de 40% os recursos destinado
à reforma agrária. Além disso, informou o Incra
, houve alteração de diretrizes e um passivo ocasionado
pelo bloqueio determinado pelo Tribunal de Contas
da União (TCU), que paralisou o acesso de famílias
beneficiárias às políticas públicas asseguradas pelo
Programa Nacional da Reforma Agrária.
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