ADRIANO PIRES
Os desafios do gás não
convencional
Sucesso da exploração de gás não convencional no Brasil depende
de uma política de incentivo que viabilize investimentos e uma definição
sobre o papel da Petrobras
Passado o aguardado 11.º leilão de concessão de áreas exploratórias de
petróleo e gás, as atenções se voltam para o leilão em que serão ofertadas
áreas promissoras para a exploração de gás não convencional.
O interesse pelo tema é potencializado pela bem-sucedida experiência dos
EUA, cujo aumento da produção de shale gas barateou fortemente o
preço do gás natural, atraindo investimentos, gerando empregos e ajudando
o país a sair da crise em que estava desde 2008. As projeções mostram
que os EUA caminham a passos largos na direção da autossuficiência, podendo,
eventualmente, tornar-se exportador de gás natural. Enquanto isso, no
Brasil, a indústria patina na falta de competitividade e o barateamento do
gás está sendo visto como um “ovo de Colombo” capaz de recolocar nosso
setor industrial no caminho do crescimento.
Mas replicar o fenômeno dos EUA não é tarefa simples e não basta ter as
reservas. O sucesso americano é resultado de um conjunto de fatores
políticos, institucionais, econômicos, ambientais, geográficos e
tecnológicos que propiciaram um ambiente atrativo a investimentos
em exploração e produção de gás não convencional. Desde os anos 70,
o aumento da produção americana resultou do apoio do governo com
políticas fiscais e incentivo ao desenvolvimento da tecnologia de
fraturamento e da infraestrutura existente para escoar a produção.
Todos esses fatores se potencializaram pelo mercado por meio do
elevado nível dos preços do gás na década de 2000, gerando o atual
boom de produção do shale gas no mercado americano.
Um longo caminho
No Brasil, pelo menos até agora, não temos legislação específica para o
gás não convencional nem incentivos fiscais/financeiros que aumentem
a atratividade do investimento. Também não há estudos completos e
detalhados sobre as reservas, o que aumenta o risco das empresas que
vierem para essa empreitada. Temos, ainda, desafios no que se refere à
cadeia de suprimento para a nova atividade.
Enquanto a distância entre poços de uma área típica de produção de gás
convencional é de alguns quilômetros, no caso do shale é de apenas centenas
de metros, por causa da baixa permeabilidade. Com isso será necessário um
grande número de sondas que não estão disponíveis no mercado doméstico,
que não tem dado conta nem mesmo de produzir as sondas necessárias para a
exploração convencional. Além das sondas, há que se criar uma logística para
que os demais insumos possam chegar aos campos de perfuração. O processo
de fraturamento exige a mobilização de uma centena de caminhões para
transportar areia, compostos químicos e muita água. O que deveria levar a
uma avaliação, se a atual política de conteúdo nacional é apropriada para o
gás não convencional. Tudo isso sem contar a infraestrutura de escoamento
insuficiente, que inviabiliza a monetização das reservas de gás convencional
da Bacia do Solimões, que já poderiam contribuir para a oferta doméstica.
Outro aspecto técnico que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) precisa
considerar é o fato de os poços de shale gas apresentarem uma taxa de
declínio muito acelerada, de 63% a 85% no primeiro ano de produção.
Isso deveria levar a ANP a repensar duas questões: o prazo da concessão
e o programa exploratório mínimo.
Ao comparar o Brasil com os EUA na questão da exploração e produção
de gás não convencional, a conclusão é que faltam uma política de incentivo
que viabilize o investimento no setor e uma definição sobre o papel e a
atuação da Petrobras. Ao contrário do mercado americano, onde há grande
quantidade de empresas atuando em todos os segmentos da indústria do
gás natural, no Brasil a Petrobras é um monopólio vertical e horizontal,
já que é a única produtora, importadora e transportadora e tem o
monopólio da produção de todos os energéticos concorrentes ao gás
natural. As reservas nós já temos. Se a produção vai se dar em 2 ou
10 anos, depende da vontade do governo de enfrentar os gargalos que
prejudicam o mercado de gás no Brasil.
OPINIÃO & NOTICIA
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