‘Espírito olímpico’ deu lugar
a ‘obrigações de patrocínio’?
Os Jogos Olímpicos da era moderna parecem balizados menos pela
confraternização dos povos pelo esporte e mais por patrocínios e marketing
Na última segunda-feira, dia 23 de julho, o McDonald’s, “restaurante oficial” dos
Jogos Olímpicos que começam nesta sexta-feira, 27, publicou em sua página na
internet dedicada às Olimpíadas de Londres algumas linhas sobre o “espírito
olímpico”. Falou-se no lema olímpico, Citius, Altius, Fortius, explicou-se que a
expressão latina significa “mais rápido, mais alto, mais forte”, e exaltou-se o
juramento olímpico escrito pelo Barão de Coubertin:
“A coisa mais importante nos Jogos Olímpicos não é vencer, mas participar,
assim como a coisa mais importante na vida não é o triunfo, mas a luta. O
essencial não é ter vencido, mas ter lutado bem”.
O McDonald’s fez até um concurso cultural valendo viagens a Londres,
sob o slogan “Viver o Espírito Olímpico”, e calhou de um dos vencedores
ser o jovem Lucca de Barros Casalenovo, habitante de uma cidade mineira
chamada — veja só — Patrocínio. Nada mais emblemático!
Mais do que ninguém, Ronald McDonald sabe de cor que, em Olimpíadas dos
tempos que correm, lado a lado com o chamado “espírito olímpico”, figura
um outro conceito, este bem menos, digamos, abstrato: as “obrigações de
patrocínio”.
Exclusividade de batatas fritas
Alguns dirão que o espírito, o olímpico, já foi há tempos substituído pelas
obrigações, as assumidas junto a multinacionais de vários ramos, em um
evento balizado menos pela confraternização dos povos através do
esporte e mais por patrocínios e marketing.
Veja a polêmica causada pelo próprio McDonald’s nas Olimpíadas 2012.
Ronald solicitou ao Comitê Organizador dos Jogos de Londres que fosse
proibida venda de batatas fritas em 800 restaurantes localizados nas 40
sedes olímpicas espalhadas pelo Reino Unido.
Pedido feito, pedido atendido: às vésperas do início dos jogos, os restaurantes
receberam instrução para retirar as batatas fritas dos seus cardápios em
submissão a elas, as “obrigações de patrocínio” — com uma exceção, a do
Fish and Chips, prato mais tradicional da culinária britânica. Este, nem a
McFritas conseguiu desbancar.
Quadro de medalhas e cotas de ‘sponsors’
Outro patrocinador das Olimpíadas de Londres 2012 que levou ao limite sua
prerrogativa de exclusividade foi a operadora de cartão de crédito Visa. A
empresa exigiu a remoção de 27 caixas eletrônicos que haviam no entorno
das sedes dos jogos e as substituiu por oito cabines onde só entram cartões
da sua própria bandeira. O presidente da maior empresa de caixas automáticos
do Reino Unido protestou, evocando o “espírito olímpico” contra o poder
econômico: “as pessoas estão se reunindo para celebrar a excelência desportiva
e devem ser autorizados a fazê-lo, sem entraves pela manobra comercial de
patrocinadores”.
Diria o mesmo se fosse ele mesmo um patrocinador? O fato é que, nos Jogos
Olímpicos de Londres 2012, como em jogos pregressos e nos futuros (como
as Olimpíadas do Rio em 2016), mais importante do que o quadro de medalhas
talvez sejam as cotas de “sponsors”…
Por falar em 2016, o Rio de Janeiro que se cuide. Há casos de cidades-sede dos
jogos que amargaram prejuízos olímpicos, como Montreal, no Canadá, que
depois de 1974 levou décadas para pagar as dívidas assumidas. Esse risco
diminuiu a partir da ascensão justamente dos grandes patrocinadores, mas,
tendo em vista que os organizadores dos jogos do Rio recentemente admitiram
que perderam as contas de quanto o país gastará com o evento, não é difícil
que fiquemos no vermelho quando o COI, o McDonald’s e a Visa desarmarem
o circo e forem se apresentar em outras praças.
OPINIÃO&NOTICIA
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