quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Município gaúcho nunca teve disputa eleitoral para prefeitura


Com 16 anos de existência, o município de Mato Queimado, no noroeste
 do Rio Grande do Sul, nunca passou por uma disputa eleitoral para a
 prefeitura. Desde a primeira eleição municipal, em 2000, nunca houve
 dois candidatos ao cargo de prefeito, restando ao concorrente único 
apenas cumprir a formalidade e assumir o comando do município.
A cidade, situada a 480 quilômetros de Porto Alegre, tem apenas 1,8 mil 
habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
 e se emancipou-se em 1996 de Caibaté. Desde então, adotou um modelo 
político singular. Segundo o prefeito Orcelei Dalla Barba, antes das eleições 
as lideranças políticas dos quatro partidos existentes na cidade (PT, PMDB, 
PTB e PP) se reúnem e decidem quem vai governar o município.
O escolhido é inscrito, então, como candidato único para disputar as eleições 
municipais. Além disso, nunca houve qualquer candidato de oposição na 
disputa pelas nove vagas da Câmara Municipal. Os vereadores sempre 
disputam sob uma coligação única, que envolve os quatro partidos. O prefeito
 explica que a ideia de se ter um consenso em torno de uma única
 candidatura vem desde a época em que Mato Queimado buscava a emancipação.
“Tinha-se um histórico do município mãe [Caibaté] e nos municípios da região
 havia muita disputa política, de muita desavença entre as comunidades em
 função da disputa política. Queríamos construir algo diferente. Juntamos as 
lideranças partidárias e entramos em um consenso. E esta já é a quarta
 eleição na forma consensual, onde não há rivalidade política e onde há
 respeito mútuo entre os partidos”, explicou Orcelei Dalla Barba.
Segundo ele, o processo de escolha do candidato único está aberto à
 população e ressaltou que 40% do eleitorado local são filiados a algum 
partido político. Segundo o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul 

(TRE/RS), apenas 8% dos eleitores deixaram de votar nas eleições municipais 
de 2008 e 10% votaram nulo ou em branco – o que demonstra que 82% dos
 eleitores compareceram às urnas e apoiaram seu nome, explica. Nas duas
 eleições anteriores, a maioria da população também havia votado em seu 
antecessor, Nelson Hentz, que também será seu sucessor, pois é o único a 
disputar as eleições deste ano.
“Existe um percentual pequeno da população, de pessoas que entendem que 
deveria se ter uma abertura e uma oportunidade de escolha com dois ou mais
 candidatos”, disse Dalla Barba. Segundo ele, caso algum eleitor não esteja 
satisfeito, existe a possibilidade de concorrer por outro partido.
Para o paranaense Flavio Artur Birck, de 41 anos, proprietário de um posto 
de gasolina na cidade, esse é um modelo político ideal, porque não há brigas 
entre os políticos e a cidade funciona bem. “É muito bom. Somos um lugar
 pequeno. Não sei se existe outro município no país que faz o que a prefeitura 
daqui faz pelo contribuinte”, conta ele que mora em Mato Queimado desde 1981,.
Em relação aos vereadores, o morador conta que é comum os candidatos 
fazerem campanha batendo de porta em porta. Nesta eleição, são 12 candidatos. 
Todos da mesma coligação, “União por Mato Queimado”.
Já José Ori Paiva, que nasceu na área onde hoje é Mato Queimado há 45 anos
 e trabalha na Câmara Municipal, concorda que o consenso em torno de uma 
candidatura é benéfico porque evita rachas políticos que possam prejudicar a 
comunidade, mas pondera. “Politicamente, se perde um pouco da democracia. 
Talvez não seja da vontade de todos os moradores ter o candidato tal a 
prefeito. Depois de aberto, livre [o processo], poderia ter outros candidatos.”
Para o pesquisador Geraldo Tadeu Monteiro, diretor do Instituto Universitário 
de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), a falta da existência de oposição política 
em Mato Queimado é realmente um problema para a democracia.
“Nos municípios onde há maior competição política, abre-se espaço para que os
 problemas sejam debatidos de forma mais aberta. Quanto maior a competitividade
 do sistema, melhor para a população, para que o poder público sofra mais pressão,
 fiscalização e vigilância. Isso é uma regra geral”, explicou.
Segundo ele, a inexistência de uma oposição na Câmara dos Vereadores torna a
 situação ainda mais problemática. “A função das oposições nos regimes 
democráticos é muito de fiscalizar e criticar as ações do governo, exercendo
 certa função de controle sobre o poder. E se o sistema não permite a existência
 da oposição, ele continua operando de modo próprio, sem nenhum controle da
 população, que favorece todo tipo de arranjo.”
O município de Mato Queimado tem uma economia majoritariamente agrícola e
 um Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese), de 0,739 (segundo
 dados de 2009). O índice, medido pela Fundação de Economia e Estatística do 
Rio Grande do Sul, avalia a educação, a saúde, a renda e o saneamento de cada 
um dos 496 municípios gaúchos.
O Idese de Mato Queimado, que está abaixo da média estadual de 0,776, coloca
 o município na 132ª posição. Mesmo comparando apenas com os 11 municípios 
da microrregião de Cerro Largo, onde se situa a cidade, o Idese de Mato Queimado
 está abaixo da média, de 0,757, e é apenas o sétimo colocado, atrás de Caibaté,
 que tem índice de 0,746.
Segundo a prefeitura, o município tem quatro escolas públicas (sendo duas
 municipais) e cinco postos de saúde, que atendem a pequenas emergências.
 Caso haja problemas médicos mais graves, o município mantém convênios com 
hospitais em municípios vizinhos maiores e três ambulâncias para transportar os
 pacientes.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), das 620 
casas do município, 601 são conectadas a uma rede de abastecimento de água
 e 615 têm energia elétrica. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita alcança
 R$ 13.431, e a renda média per capita nas famílias, R$ 573.


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